quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

Polissíndeto

Criança com imaginação fértil que era, Laura imaginava uma história para tudo o que aprendia, tudo o que via.
Com o passar dos anos, suas experiências imaginárias poderiam tornar-se livros de crônicas. Ela havia viajado e conhecido intrigas e conquistas de todas as aulas de história que assistira, e conhecido histórias do descobrimento de cada detalhe da geografia, da invenção de cada fórmula da construção de toda a tabela periódica, dos filósofos, sociólogos e havia se colocado no lugar de cada pintor que conhecera nas aulas de artes, tentando sentir o que eles haveriam sentido em suas épocas.
Porém, ela não gostava de português.
Eram só regras, cada qual com suas muitas exceções, análises sintáticas que julgava inúteis. Não entendia como poderia haver uma interpretação correta para cada texto - já que acreditava que cada texto era uma autointerpretação do autor,e assim, de interpretação subjetiva para cada leitor.
Até o dia em que teve uma aula sobre figuras de linguagem.
E ela descobriu que cada figura de linguagem era um resumo da vida em si.
Quantas metáforas cabem em uma frase apaixonada dos antigos escritores barrocos para tentar descrever seu amor? Quantas comparações faz uma criança tentando explicar seu mundo dentro de seu conhecimento? Quantos pintores nos trazem à mente a sinestesia? Quantas catacreses nos fazem esquecer o real nome dos objetos? Quantas vezes não nos importa o nome do livro, desde que ele seja um Machado de Assis?
E a vida, e sua continuação infinita, e a finitude de cada ciclo de existência, e cada viagem imaginária ou não, e as dores, e os amores, quantos polissíndetos se encaixam neles?

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