sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Ponto de Vista de um Galeroso

Todo mundo faz parte de algum grupinho na escola. O meu, as pessoas gostam de chamar de "galera". Eles dizem que a gente é violento e propenso a se tornar marginal quando crescer. Tem gente ali que acha que eu sou um animal. E as pessoas colocam nos jornais e na televisão as coisas horríveis que galerosos, como nós, fazemos, e acham que estamos errados, que a vida não precisa ser daquele jeito e que não é porque moramos na periferia da cidade que podemos quebrar a escola, andar com terçado dentro da meia e forçar as meninas a ficarem com a gente. Agora, eu acho que tenho direito de expor meu ponto de vista, porque não parece, mas também sou gente.
Alguém aí já viu galera no Paraviana? No River Park? Não tem, né? Tem, no máximo, aqueles adolescentes que saem de mountain bike por aí pra roubar as pessoas, armados com faca de cozinha da Tramontina. Isso acontece porque nesses bairros, pelo menos 90% das crianças tem um iPad em casa, e pelo menos 70% dos pais dessas crianças ganham mais de 5 mil reais por mês. Esse dinheiro dava pra comprar comida pro pessoal do meu bairro inteiro, por bastante tempo. Minha mãe nem sabe o que é um iPad.
Esses dias, o pessoal da minha escola chamou a polícia pra impedir eu e meu grupo de quebrar os vidros e dar umas facadas numas professoras que iam reprovar a gente. Tem exagero maior? Querer que eu estude e passe de ano, como se já não fosse o suficiente eu ter que ir pra escola porque, segundo a lei, lugar de criança é na escola. Querer que eu estude e dê o melhor de mim sendo que o pessoal do Paraviana só enfia a mão no bolso, tira alguns milhares de reais e já tá na faculdade com um 10 garantido na monografia. Querer que eu queira dar o melhor de mim? Gente que nunca chegou ao ensino médio, como o Lula, tem os mais altos cargos do país, mora nos melhores bairros, come a melhor comida e tem tudo o que é mais caro que a vida tem a oferecer, além do apoio do governo, e, minha mãe, por exemplo, passou a vida dando duro em escola pública, tá aí, limpando a bunda dos filhos dos riquinhos. Ela teve que abrir mão da faculdade porque não ia dar tempo de sustentar a família e estudar.
Tem gente por aí que ganha milhões de reais pra sorrir pra uma câmera e mostrar as pernas durante 30 segundos, e minha mãe ganha um salário mínimo por mês. Essas pessoas fazem pilates, têm personal trainer, moram em prédios chiques e jantam sushi, andam de helicóptero e passam os fins de semana no spa. E eu duvido que elas tenham faculdade. O que elas têm é dinheiro. Dinheiro não compra felicidade, mas compra uma boa parte dela. Felicidade não é só amor - isso é o que o dinheiro não compra -, é saúde, bons médicos, comida garantida na mesa, boas escolas e sete reais pra ir ao cinema de vez em quando. Cinco mil reais por mês dá pra ir ao cinema 667 vezes.
E aí, quando a polícia foi lá impedir a gente de quebrar a escola, quem era que estava praticando justiça? A gente ou a polícia?

6 comentários:

  1. Sempre gostei do seu blog, mesmo quando você não postava quase nunca, mas agora você evoluiu muito! Desde julho, estou percebendo. E acompanhando, também. Sempre achei que você tinha muito potencial, mas esse post em especial me surpreendeu muito, porque você fala como se realmente fosse um galeroso! Muito bom! Parabéns e continue escrevendo, porque tem muitos jornalistas de olho em você....

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  2. seria super bom se você se identificasse, mas fico feliz em saber dessas coisas. :)

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  3. Convenhamos que, se eu me identificasse, perderia todo o charme.

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  4. Estavas tão linda no Pecado da Gula, hoje.

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  5. estavas linda. Linda, mesmo. E parabéns pelo namorado, vocês pareciam estar se divertindo. Não fiques curiosa em relação à minha identidade.. Conhecemo-nos, já. ;)

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