segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Quintal

Tratava-se de um universo onde pequenos homenzinhos com sapatos octogonais andavam de skate em folhas de cajueiro. Eles enfiavam canudinhos nos cajus que os passarinhos traziam de cima das árvores para poder almoçar. Viviam só de frutas, no caso, aquelas que o dono da cidade que habitavam cultivava: caju, goiaba, ata e jambo. Tratava-se de um universo onde tanto fazia o tom de pele, a crença e a religião, essas eram coisas que não se discutia. Todos eram iguais, feitos de carne e osso e trabalhando em prol da mesma coisa: o bem de Quintal.
Eles fugiam quando vinham aqueles gigantes dar banho nas plantas com um tubo que soltava água. Escondiam-se quando aquele monstro marrom ficava solto, à noite, cavando buracos e desenterrando as leguminosas que os homenzinhos plantavam. Entravam em seus prédios, situados dentro da casca de cada árvore, e esperavam a chuva passar. Alguns colhiam a água em folhas para armazená-la: aquelas gotas eram tão grandes que cada uma delas servia a população inteira por uns 3 ou 4 dias.
Para o Natal, eles enchiam as árvores de vaga-lumes, e, para o ano novo, se vestiam com pétalas de jasmim.
Um dia, um homenzinho curioso andou até além dos limites de Quintal. Ele descobriu um chão duro, branco, que os gigantes chamavam de Varanda. Uma cidade vizinha. Que tipo de leguminosas se plantava naquilo? Ele continuou indo adiante, e viu uma grande estrutura de um material desconhecido que parecia abrir e fechar, quando necessário. O monstro marrom estava lá, e alguém gritou "tirem o Tigre do portão!", o que o ajudou a constatar que aquela estrutura chamava-se Portão.
O homenzinho passou por baixo de Portão. E não houve palavras para descrever a surpresa dele quando passou uma coisa enorme e vermelha, com rodas. E havia mais uma cidade, com o chão quente, que, como ele ouviu, se chamava Rua.
Ele passou um tempo nessa cidade longínqua, chamada Rua, desvendando seus mistérios e aprendendo suas manhas. Quando voltou a Quintal, ele inventou o Dispositivo de Rolagem, em Rua conhecido como "roda". Nome muito simples para objeto muito complexo. Inventou, também, o Aparador de Chuva Multifuncional, em Rua conhecido como "guarda-chuva". Em Quintal, usava-se esse objeto para 1) proteger-se da chuva 2) armazenar gotas de água e 3) defender-se de Tigre.
Aquele homenzinho tornou-se o novo governante de Quintal, e governou durante toda a sua vida. Quando estava prestes a morrer, levou um pupilo a Varanda e a Rua para que ele aprendesse como se faz no mundo afora. Ensinou que não importa o quanto a gente imagine, ainda tem muito mais pra imaginar. Considerando o tamanho do universo, seria uma boa idéia expandirmos um pouco a nossa visão.

2 comentários:

  1. Achei incrível, viu? E me lembrou o Guia do Mochileiro, na parte em que a planta e a baleia caem do céu, e no caminho o autor descreve seus pensamentos. Genial

    :D

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