Alice acorda, depois de algumas horas inconsciente. Está sozinha no esconderijo de seu sequestrador. Depois de ponderar muito, ela resolve não se deixar sucumbir como a maioria de crianças sequestradas faz. Sebastian não penetraria em seu escudo psicológico. Como a melhor defesa é o ataque, ela resolve se comportar da única maneira que ele não esperaria: sendo simpática e mantendo-se calma.
Sebastian acordou e foi ao mercado. Ele comprou algumas frutas e refeições semi-prontas, como nunca aprendera a cozinhar. Tranquilamente, andava pelos corredores, quando se lembrou que sua refém estava no esconderijo e a qualquer hora acordaria. Ela fugiria, avisaria à polícia o que aconteceu e, em horas, ele e seu pai seriam presos. Não, isso não podia acontecer. Largou a sacola de compras no chão e saiu correndo de volta ao esconderijo.
Ele abriu a porta com força e desceu as escadas como se deslizasse. Em questão de segundos, estava empurrando a porta que o levaria ao flat subterrâneo onde havia deixado Alice.
Quando abriu a porta, tudo estava silencioso. O cheiro de mofo de quando chegaram havia sido substituído por um delicioso aroma de lavanda e... Comida? Havia uma música leve tocando ao fundo. Sebastian entrou, desconfiado e atônito.
Reconheceu a música que ouvira tantas vezes em sua casa, na Inglaterra. "Je T'Aime Moi Non Plus" de Serge Gainsbourg.
Ele encontrou palavras, que saíram meio distorcidas.
- Alice?
A música parou.
- Sim?
Ele entrou e a encontrou com um violão.
- O que você... De onde esse... Violão? E a... Lavanda? Você... Fez comida?
- Eu limpei a casa. Tinha detergente no armário branco da cozinha. O violão estava embaixo da cama. E a comida estava toda congelada na geladeira, eu só a preparei. Não aguentava mais o cheiro de mofo, o tédio e a fome. - Ela falou, como se fosse uma situação normal. - Ela se levantou. - Achei que você estaria com fome.
Sebastian ficou, por um momento, sem saber o que fazer. Nunca havia sequestrado uma pessoa antes. E Alice era uma vítima muito complicada. Decidiu, então, apelar para a violência e mostrar a ela que ainda estava no comando.
Ele a agarrou violentamente pelo braço.
- Você vai fazer o que eu mandar. Não sei se ainda não ficou claro, mas você foi sequestrada. Pessoas sequestradas não limpam a casa, nem fazem comida, nem tocam violão! O cheiro de mofo, o tédio e a fome farão parte do seu dia-a-dia agora, e eles serão o mínimo que você terá que suportar! Parece até que você não sente medo.
- Mas eu não estou com medo, mesmo.
- Quem é você? Uma psicopata?
- Se todas as perguntas tivessem respostas, o que seria dos mistérios?
Adaptado de Entre Amor e Morte.
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